Regressar [E tudo recomeça num regresso inaugurado]
Num estranho sossego, o sol começou a cair numa espiral de aborrecimento. Ergueram-se os olhos. Calaram-se as mãos. O corpo amparou-se nas paredes despidas e quentes daquela tarde de Agosto. Arrefecerá no dia em que o sol se erguer. Ali, onde o estrondo aconteceu. Uivaram os muros. Secaram as fontes e os pássaros bradaram canções enfraquecidas. Chorou a árvore que morreu no final do verão. Fora de tempo. Depois de muitas águas, pernoitaram ecos moribundos e árvores sem ninhos. As andorinhas preferem os beirais dos telhados longínquos. Por isso, vão. Para tornar a chegar. Longe das mãos, perto da luz. Então, envolvem-se em bailes de alegria. E dançam, dançam até as asas quererem. Depois, a noite. Longos são os sonhos, curto é o dia. E tudo recomeça num regresso inaugurado. Quando o silêncio se esgota na efemeridade das vozes, dizem as palavras que calam na enorme vontade de voltar para a frente. E afirmam que o mar está colado ao rio e o rio às cegonhas que pulam para os ninhos de bico farto no deleite da merenda. E eu, numa cantilena quase calada, asseguro que o meu rosto está atado ao rio que está ligado à minha terra que está presa ao medronhal que está agarrado ao pardal que esvoaça no beiral do telhado onde me abrigo e descanso num cordel de estendida memória que está subjugada ao azul com que pintaram o quadro. Onde regresso para me aproximar outra vez.