Nevoeiro [na claridade do tempo]
Gosto das tardes tristes de inverno. Do nevoeiro em que me deito e descanso num baloiço de braços. No lume que crepita e se perde no céu da memória. Depois corro! Corro na alegria da chuva e adormeço no segredo das vozes. No atropelo dos passos. Gosto das tardes tristes desfeitas no cinzento do tudo que não vejo, mas sinto. E desfaço-me no mito. Gosto dos dias tristes! Com nevoeiro espalhado pelo chão onde procuro a razão fundamental para a interrupção da comunicação. E satisfaço-me no engano da cor. E finjo que as mãos que seguram o frio não são minhas, não. Numa excêntrica e imperecível tarde de nevoeiro.
Apenas o cão vagueia descontente pela hora do silêncio. E cala-se na tristeza do caminho. E fica caído também. Como se gostasse das tardes tristes de inverno e visse o que estava no outro lado da manhã. E eu abraço-o com o carinho que me escorre dos olhos. E repito que gosto das tardes tristes de inverno. Só não sei a razão deste tanto gostar. Se não vejo. Se não sei o que esconde o nevoeiro. Por mais que estenda o olhar, gasto-me a olhar para lá. Redizendo que não vejo a claridade destes dias de inverno.