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ponto de admiração

ponto de admiração

31
Ago08

apregoar

Paola

  © Antero Valério

 

Agora que Agosto faz as malas e a Costa de Caparica está em obras, vejo as sombras do Verão. Oiço ondas de nostalgia e vejo marés de alcatrão.

 

- olha à boola de Berlim… a boooooooola!

- Senhor! Senhor...

 

E a cesta levantava um paninho branco que escondia delícias dali. Ouvi dizer que já não é a mesma coisa. Vem aí a ASAE. Ainda bem que a praia não tem portas. Ou tem? Taipais, tem? E muro? Não tem. Ou tem?

 

- Olha os bolos, olha a bola-de-berlim!

 

Controle-se a higiene. Pelos padrões todos. Mas não tirem um daqueles prazeres que, há muito, transporto no meu imaginário afectivo.

Não sei se há registo, todavia tenho curiosidade. Quantos casos de intoxicação com as fantásticas bolas compradas na areia da praia? Mais incidentes existirão com intoxicação política. Ou não? Há? Não, não há. E por favor, não enfiem as bolas em saquinhos deprimentes. É que perdem o sabor... Bolas!!

 

 

30
Ago08

adormecer

Paola

  regresso à escola ou

 

 vidas, pecados e saltos mortais

 

É sábado, eu sei. Amarelo e estreito. E depois? Um dia a seguir ao outro. E o outro é sexta-feira. E depois? Se a contagem é decrescente. E o ano tem nome. Não é Juliano, não. Nem sequer Gregoriano. Tem nome que não digo. Há muito que a maravilha é a Lua. Também o Sol. Ainda mais o encadeado dos dias e das noites. E a Lua tem fases. E a minha não é boa. Mirra-lhe o brilho que já teve. Definharam as vontades. Adormeceram as intenções. O tempo é insuficiente para recitar o ciclo das estações. E agora é Inverno. Neva no beco sem ali. O Sol desfez as lendas, abriu fendas. Está frio. Tenho frio!

É sábado. A semana tem sete dias. E o sete é um número de mistérios. Significados e simbologias. E sete são os dias da semana. E depois? Se o sétimo dia é sábado. E sete são os pecados mortais. Inveja, Gula, Soberba, Vaidade… perece o último sábado de Agosto. Eu sei. É sábado. E depois?

O sete é símbolo da perfeição. E que importa se é uma ilusão? Se o mês acaba aqui. Amanhã é Setembro e eu já nem me lembro de um dia assim. Desconsolado e pardacento. E como o gato tem sete vidas, quando só de uma necessita, duas serão para mim. Fico com três. Exactamente a conta que Deus fez. Para morrer e ressuscitar a seguir e voltar a morrer quando calhar a minha vez. É sábado, eu sei. E depois? Se é o último e as inquietações chegarão mais do que sete. Por isso, não comi, como de costume, o admirável arroz-doce da dona Perpétua. Porque segunda-feira não é dia gulodices. E a gula é um dos sete pecados mortais. 

Segunda-feira é a introdução. O ponto de partida da história e a apresentação das personagens. O desenvolvimento vem a seguir. A intriga e muitas peripécias. E o clímax chega de mansinho. A conclusão? Só quando tudo estiver bem resolvido. O desenlace? Narrativa aberta. Com algumas fendas. Prometo não invocar o santo nome de Deus em vão. Sempre que possível e se o engenho e a arte me coadjuvarem. E santificarei os domingos, certamente. Os sábados  que os antecedem. E todas feriados e dias santos. Todos!

Porém, não me obriguem a guardar castidade nos pensamentos e desejos. Desacordos e insatisfações. Não posso! Nem serei capaz. Mas vou pedir que me contem uma história de pensar. Com os Sete Anões. A Branca de  Neve mais o Príncipe. E o beijo. Mas sem a madrasta rainha. Para não ter que fugir a sete pés. Não posso. E a minha intimidade como os laboriosos pequenotes conta-se no livro que recebi num Natal, em Dezembro.

 

 

[imagem da Internet]

 

29
Ago08

tourear

Paola

a vaca não tem culpa

 

 

Não entra mais uma alma. A praça está atulhada de gente sôfrega. As bancadas da praça pintam-se da cor do Verão. Da exaltação e da impaciência. Na arena, há pedaços de pânico. Verónicas de medo. Capotazos de arrojo. Nas bancadas, os olhos estão incrédulos. No redondel, capotes a rigor misturam-se com lágrimas do suor que escorre assustado. A multidão acena palmas e olés. O cartel garante-lhes um espectáculo assombroso. Inolvidável. Único. As palavras chegam às tábuas vestidas de espantos. Imperceptíveis. Cá de baixo, os rostos não têm feições. O bruaá antecede as cortesias. O cornetim anuncia a hora. O pavor assalta e mistura-se com a vaidade. As mãos tremem intimidadas com a pega de caras. E advertem que não sabem nada daquilo. Que a valentia não está ali. Mas  o apoio escorrega das bancadas. Desistir seria a vergonha. As pessoas pagaram bilhete. E a diversão tinha que continuar. A inquietação  voa de olhar em olhar. A cumplicidade também. E medo não é fraqueza, porém o risco é verdade. Ali, na areia ocre não há treino nem perícias. Apenas descaradas afoitezas. Imprudências juvenis. E ao som do cornetim começam a entrar os artistas. Que fazem do sobressalto graça. E a mole humana ecoa júbilos colectivos.

 

- Touro! Ó touro lindo! Chama com passos amedrontados.

- Touro! Insiste com o capote tremulando advertências.

 

A assistência enlouquecida pede mais. Mais arrojo. E as pernas flutuam a cada movimento do bicho. Pela cor negra da pelagem. Pelos cornos em pontas que estavam embolados. Ninguém via. A multidão não cala a êxtase. O boi investe. Ninguém via. E o toureiro cai no chão.

 

- OOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOh!!!

 

A humilhação pública acontece na arena da praça de touros. A saída em ombros jaz na terra castanha e arrependida da arena. O toureiro permanece estendido. Entram os forcados. E os cavaleiros. E mais toureiros. O público levanta-se. As palavras calam-se em silêncios suspensos. O homem é levado em ombros. A multidão ovaciona. Esgotam-se os aplausos. Gritam-se olés e hurras muito arrebatados. Emocionados. Dá a volta. Não consegue perceber que é figura  do espectáculo que sucumbiu à primeira faena. No rosto rasga esgares de dor. De derrota. O sucesso de uma cornada memorável. E recolhe à enfermaria.

 

E volta convencido que é figura de primeiro plano. Recebeu duas orelhas na mesma tarde. Por isso, é carregado nos ombros e transportado para fora da arena até o portão principal. Ali, mereceu o galardão máximo para um toureiro. Sem saber que a ambulância imprime arte à lide de tourear o percurso para o hospital. E pergunta como pode explicar a gratuidade da aventura. E se o touro o matou. Não! No Minho, bem à tardinha, Apolo recolhe a manada. Atravessa uma nuvem aqui e outra acolá. E as pachorrentas vaquinhas dormem na corte. Sem culpa que a neblina negra do medo lhes adultere a condição. É o cheiro que avisa que elas estão ali. Podemos facilmente perdoar uma criança que tem medo do escuro; a real tragédia da vida é quando os homens têm medo da luz.” Platão lá sabia porquê. É preciso ver!

 

 

[Fotografia de GMV]

 

28
Ago08

caminhar

Paola

 pegadas de amizade

 

 oito alegres pés

 

 

 

Afeiçoados na vontade de caminhar, num dia de morno de Agosto, seis pés rumam ao Sul. Levam a vontade de abraçar o mês que vai acabar. E querem beijar o mar. E todos seis correm para o Sol. E andam, andam até lá chegar. Envolvem-se no amarelo e admiram-se com o azul. Surpreendem-se com o verde. E comentam que arrulhar rima com marulhar. E o mar espreguiça-se. E lá ao fundo, a cadência é marcada pela vastidão azul-mar. E correm atraídos pelos cânticos sem olhar para trás. Ouves? É o mar a desenhar poemas na areia. Pois é. O mar é um poeta, disseram dois. Um escultor, opinam os outros dois, olhando as obras cinzeladas ao longo de tempos de Inverno. E comentam que ali habita Orfeu. O mais prodigioso músico que já existiu. Poeta também. Por isso, as gaivotas poisam para o escutar.

 

Oito contentes pés foram espreitar o mar. Mais dois se juntaram. E todos os oito pés na areia dançaram. E Orfeu males sana cantando e tocando a sua lira de ouro. Músicas de espuma. Canções de areia. Ritmos do mar. E dois dos oito pés vão continuar a cantar. Porque nesta sinfonia da vida, oito são mais do que dois.

 

 [fotografia de Paola]

 

27
Ago08

pintar

Paola

lágrimas de Agosto

 

 

Agosto despede-se. E chora. Faz birra e esconde o Sol. E as nuvens desenham no céu sonhos coloridos de crianças. Descansos e cansaços saudáveis. Preguiças e bocejos admiráveis.

O mar pinta-se de azul-marinho. Ali escuro. Acolá transparente. Claro. Admirável e barulhento. Picado, afirmavam. Ponteado de cristas brancas. Agitadas e nervosas. Agosto também. Para a semana é Setembro. A praia está só. O mar indómito.A areia penteada. Restos de chapéus de sol olham para o mar e carpem a desgraça. Há muito que Agosto não tinha um dia assim. Os corpos ávidos de sol são fustigados. E escondem-se em panos alugados. O deserto começava a estar ali. O vento guincha fúrias contidas. Hipocrisias caladas. Afectos traídos. Vaidades assumidas. Tão forte e tão frio. E o vento cospe nos rostos a areia que já não quer. E desliza num mar de queixumes, na certeza que as forças da natureza são incontroláveis.

 

E o vento bate à porta do meu sossego. Vai-te daqui, ordenou descontrolado. Não entendi a razão. Insurgi-me com os modos. Não grites comigo, disse com autoridade. E o vento lastimava que assim tivesse acontecido. E sussurrou-me sem alarido que não estava a gritar. Foi só um guincho. De uma mão cheia de areia.

 

 

 [fotografia de Paola]

 

26
Ago08

assobiar

Paola

a feminina e histórica culpa

 

Um padre mexicano suscitou uma assobiadela das grandes. Seguro na sua decisão, o homem recomenda às mulheres que não usem minissaias ou biquínis. Assim, evitar-se-ia o assédio sexual. As mulheres ficariam na paz dos anjos e os homens sossegados. Não há dúvida. O mal é feminino. Malditas mulheres. Demoníacas. O que elas inventam para provocar os afoitos machos. O clérigo descobriu o fundamento para tanta violência.

 

Dizem as lendas que Lillith foi a primeira mulher de Adão. Irritada com a submissão insurgiu-se. E depois de amores falhados e insípidos fugiu. Emerge Eva. Obediente e mansa. Dependente. Adão gostou. Os homens gostam. Mas gostam tanto que nem lhes passa pela carnal cabeça que tivesse existido uma tal Lillith. Parece que ao padre mexicano também não. Inicia perseguições. Oculta o mundo feminino. Cala-as. Ignora-as. Acusa-as do mal do século. De heresias. Acende a fogueira. Empurra-as para lá. As potenciais pecadoras não merecem melhor sorte. Disseminadoras de pecados. E assim se validou a submissão da organização deliberada pelos homens.

 

O padre mexicano não incrimina a maçã. Muito menos a serpente. Ovaciona o paraíso, alerta para o fruto ilícito de saias vestido. E apregoa que a ignorância não é pecado. Mas é! E para ajudar o padre, eis que surge, nesta história, o reitor de uma universidade. Também ele instruído. E muito respeitador. Aplaude o padre e, do alto da sua cátedra, muito bem explica. Toda agente aprende. De facto, o assédio e os actos de violência contra as mulheres são causados pela sua forma de vestir.

 

As coisas que a Igreja inventa! As coisas que as universidades sabem! E eu juro que não sabia. Lá, como cá! Ainda me admiro com a posição da Igreja. Mesmo que individualmente assumida. E, nem eu sei a razão, a minha memória contou-me histórias. Com séculos de teimosia. Com verdades mentirosas. E o Papa teve um encontro a portas fechadas com as vítimas de abusos sexuais cometidos por membros da Igreja Católica…E pede desculpa. Mas o padre mexicano não concorda com conversas ou gracejos picantes. Das mulheres, evidentemente! Que pena. Que sensaboria. Uma conversa sem malandrice não tem espírito, senhor padre! Desenvolve o pároco que as minissaias despertam o "lado doentio" dos homens. Ele, que é homem, ou padre, lá saberá de que fala.

 

Admiro-me, ainda, com estas clérigas atitudes. Admiro-me com o disparate repetido ao longo da História. Admiro-me sem qualquer borbulhar feminista. Admiro-me por ser mulher. Só por isso.

 

fotografia da Internet

 

24
Ago08

sem rede

Paola

vidas desgraçadas

 

Hoje, nada de novo por aqui. Uma sexta-feira morna de Agosto. Numa manhã que teima em acordar de férias. Aqui e ali ouvem-se tristezas molhadas. Com água salgada, talvez morna. Seguramente fria. Tranquila e serena. Chora-se o regresso à balbúrdia. Ao ritmo acelerado. Ao trânsito irritado da cidade. No entanto, lá fora corre tudo mais depressa. Os chineses surpreendem-se com a lusa vagareza. Dizem que lá não é assim. Chinesices!

 

Na papelaria da esquina um homem compra o jornal. Um rapazito entra controlado pela mão do pai. Que compra outro jornal. O rapaz protesta. Exige a aquisição de uma qualquer coisa. As lágrimas e lamúrias manchavam a dicção. E exigências. E pedidos. E o progenitor à beira de um ataque de nervos. Para se tranquilizar pede ao catraio que explique. Que precise o que pretende. O miúdo, entre soluços e raivas, elucida que quer outra. Que a que ficou em casa da avó já não serve. Só lá que é uma aldeia parca em gente pequena. Agora que veio de férias, exige uma melhor. Para ser cobiçada pelos amigos. Única. Notável. Quase verdadeira. E assegura que até pode ser. Uma autêntica seria admirável. E senta-se no chão. O pai dá sinais de ceder à envergonha pública. O petiz esperneia exaltações sem calibre. E o pai diz-lhe que sim. E saem os dois. Com a promessa de satisfazer a vontade da criancinha. Os olhos que assistem brilham incrédulos. Os rostos vincam o grotesco da situação. As bocas emudecem a atónita desinteligência. As mãos controlam mutuamente um desmesurado desejo. O garoto valia uma bofetada. O pai, no mínimo, três. E já de saída, o homem esclarece. Desde pequeno que ele é assim, sabem? Sempre gostou de armas. Adora fingir que mata todos lá em casa. E os amigos. Agora teima. São crianças. Temos que lhes fazer a vontade. Coitadinhos! Ele quer uma a sério… viu numa revista de videojogos. Mas para crianças. Bom, vou à procura…

 

Na televisão, as notícias atropelam-se. Postos de abastecimento de combustíveis assaltados de madrugada. Os criminosos abalam com uma caixa multibanco de rojo. E o despiste de viatura roubada. Mais três mortos lá para o norte. Intervalo para escutar a Portuguesa em Pequim.  Depois cinco homens encapuzados, alguns falavam português, três viaturas e explosivos entram em acção. Arrombam as portas traseiras e agarram os sacos com notas. Nada de moedas. Pesam muito e não são a mesma coisa. Uma realidade nunca vista no país. Coisa de profissionais. Bem gizada. Isto de amadores tem que acabar. Pequim que o diga. E o campeão do salto chora lágrimas de total satisfação. Mas é no Norte que um ourives impede um assalto de encapuzados e armados bandidos. E sabe-se que o seu companheiro de profissão morre no Sul. Os ignóbeis acertaram-lhe mesmo. Na praia, aqui bem perto, roubam um BMW para assaltar um posto de gasolina. Uma máquina a sério! E o pobre do polícia, pronto para entregar as chaves que dão acesso a casinhas sociais, é agredido. Mais assalto, menos assalto. E acidentes. E mortos e feridos. As notícias repetem-se. O luso saltador sobe o degrau. Ao peito exibe o orgulho de ser o melhor. Enquanto por cá se fica a saber que a violência doméstica já matou mais este ano que em tempos anteriores. Não há paciência! Trinta mulheres mortas? Bestas! E como se tudo já não fosse muito, eis a mafarrica da lagartixa. Sem permissão, entra no carro e assusta condutor. O réptil provoca o acidente, gera um ferido e foge. Os humanos já não chegam? Francamente!

 

E a corrida às armas dá milhões ao estado. Uns míseros 4,2 milhões de euros em impostos. Que para uso e porte de arma é preciso pagar. A quantidade de armas ilegais é muita, confessam!

 

Desliguei o televisor. Em Pequim já não se houve o hino nacional. E o catraio da papelaria anda a ver muitos filmes. Calma! São situações pontuais. Tudo vai bem, e muito seguro, neste reino de Portugal.

 

 

Fotografia de João Palmela

23
Ago08

sabores de sábado

Paola

  à moda antiga

Admirável gulodice. De aroma e sabor. Flexível na forma de cozinhar. Prepara-se na tolerância dos usos e costumes da gente. Sempre com uma boa dose de prazer.

 
1 Chávena de chá de gargalhadas

1 Pitada de coscuvilhice

1 Vagem de lágrimas

2 Litros de benéfica amizade

1 Chávena de chá de idoneidade

1 Pauzinho de desatino


No café da Dona Perpétua, sentar na mesa mais afastada do balcão. Por causa dos atropelos matinais. Há quem vá para ali tomar o pequeno-almoço. Juntar um pouco de coscuvilhice, apenas a cobrir o tampo e aguçar o engenho da oratória, e uma pitada de lágrimas de rir. Levar a conversa moderada, mas mexendo sempre. Com as duas mãos. Energicamente. Sempre que necessário, com os dedos também. Para contar. Para indicar.


Juntar a amizade, sem lavar, e levar ao fogo das palavras, mexendo sempre, sem deixar secar completamente a boa disposição. Enquanto mexe, não deixe de cumprimentar quem chega à mesa. Ou quem passa.


Entretanto, convém ir pondo os projectos a aquecer. É conveniente mudar local. De preferência mais arejado. Sempre de acordo com o que vai fazer a seguir.


Quando o assunto começar a secar, juntar outro bem quente e aos poucos, gargalhando sempre. Acrescente uma pitada de bisbilhotice e um pouco de vida pessoal.


A prosa deve ir sempre fervendo em lume brando. À medida que vai secando, junta-se mais, em pequenas quantidades, sem deixar de mexer. Sempre a conversar.


Quando terminar de juntar as palavras, acrescente as compras e os desatinos. Mexer e deixar ferver. No final, passar tudo por planos futuros. Há que preparar a semana com antecedência.

 

O processo de cozedura demora cerca de 5 horas, às vezes 6. Ou 7. Até pode durar o dia todo. Tudo depende da qualidade dos ingredientes. E da vontade de comer.

 

Aproveite para almoçar. De preferência grelhados. E muita salada. Verdes de tonalidades várias. Combinam com a cor da canela. Aproveite para apurar a conversa e cimentar a amizade.

 

É preciso paciência, mas vale a pena! Serve-se frio, morno ou quente. Depende dos gostos. E do apetite. Em taças, pires ou travessas. Depende de quem come. E sempre, mas sempre muito bem adornado com risos, gargalhadas e cumplicidades com cheiro a canela.

 

Se se esquecer de algum dos ingredientes, não desespere. Recorra ao telefone. Acrescente o que estiver em falta. E continue a mexer...

 

 

foto da internet

22
Ago08

babar

Paola

 palavras babadas

 

 

Uma língua lambe-se com palavras. Dádivas que dizem o que se fala. Delimitam-se em fronteiras gastronómicas. Encantam-se nas cantigas de embalar. Nas lengalengas. Adormecem com histórias de encantar. Completam-se nas interjeições sentimentais. E cumprem-se na diversidade de aromas e sabores. Riem-se com onomatopeias brincalhonas. E jogam às escondidas com sinónimos e antónimos. Apaixonam-se e dão risinhos estridentes. E o determinante muito definido, masculino e único. Corpóreo e puro diz-se desvairadamente perdido de amores. Elevado com o nome. Também ele masculino. Por causa da concordância. Moreno. De olhos negros. Vivos e brilhantes. O artigo cansa-se com o assédio. Irra! É demais. Esperneia quando o nome é próprio e o amor singular. Mas diz-lhe que sim. Porém resiste. Enleiam-se num jogo de sedução cúmplice. O determinante persegue o nome. E este esconde-se para ressurgir risonho. Depois é o nome. Oculta-se também. E gargalham brincadeiras de rir e de chorar. Na rua passeiam a vaidade. Com atributos de todas as cores e paladares. No masculino. Singular. Trocam beijos e afectos em público. Abraços e mimos. A inocência da idade não lhes impõe bulícios desarvorados. Apenas sorrisos. E conivências no olhar. Oferecem-se na sedução do romance e do extraordinário. E publicam palavras atulhadas de afectos. Tantas. Todavia, preferem as que se iniciam por i. Imagem. Intuição. Importante. Imenso. Instinto. Iluminação. Infância. Identidade. Ir. Ir em frente. Inicial de inicialmente. Isaac de nome. Próprio. Alegria, felicidade e também filho de promessas. De juras de amor.
A gravidade explica os movimentos dos planetas, mas não pode explicar quem colocou os planetas em movimento. Nem este novo e admirável astro. E as palavras que eu sei não chegam para dizer o I.

 

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Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto. [Fernando Pessoa]

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