Parecer [quando as silvas sabem ao amargo dos juncos]
Ao longe parecias-me tu. E de tanto olhar, vi-te no aparato da saudade. Pelos teus olhos, escorria um rio azul na alucinação do mar. A crença obstinada trauteava incertas melodias ao som do verde do alento. O aroma rugoso dos juncos chegava no sopro do vento. A agilidade dos teus dedos acalorava-se nos remos abalroados pelo Sol. No lodo das marés. Num esforço calado a subir a ladeira.
Ao longe, parecias-me tu. Mas era tão perto. Agora. Gostava do silêncio com que me falavas à tardinha. Há um sabor gelado nos juncos que estão na margem. Não te tenho. Tenho. Pouco. Nada. Tudo. E eu trocava cada pétala por um olhar. Por uma palavra que me obrigasse a assentar os pés no chão.
Ao longe, parecias-me tu. É impressionante a frequência com que erro. Pasmo-me com os corpos apáticos à verticalidade do andar. Erro porque os meus olhos vagueiam na desorientação do caminho, perdidos na cumplicidade dos silêncios à beira da estrada. Às vezes, disfarço que não te vejo, só para que não me repreendam. Não tenho culpa que passes nos rostos dos outros. E mascaro-me na pacificação das silvas. Que se compõem todas as manhãs nos ressaltos contorcidos do terreno.