macacar
macacadas I
a auto-extinção humana
Quase metade das espécies de primatas está em risco de extinção. A notícia espalha-se pela televisão, jornais e afins aos gritos catastróficos. Indício que a coisa é mesmo grave. Admirável o nosso planeta. Redondo e robusto. Talvez frágil para quem o vê lá do alto. Iluminado e misterioso. Verde. Mas muito azul. Ao que parece, o único planeta conhecido a abrigar vida no sistema solar. Mesmo que existam, os extraterrestres não contam. Porque são verdes, muito feios e têm antenas na cabeça. Já chegam as parabólicas que polvilham as varandas e os telhados. E as paredes contíguas às varandas. Gostava mais daquelas que sobem aos telhados de braços bem esticados. Orientadas ao emissor mais perto. Quando o vento destrambelhava aquilo tudo, lá iam os homens ao telhado para as colocar na direcção certa e acabar com os chuviscos na sala. Era sempre uma emoção. Por causa dos riscos.
O ser humano anda por cá há um milhão de anos. Tempo bastante para perceber que o segredo é amar e não devastar. Que errar é próprio do homem. Insistir no equívoco é próprio dos idiotas. A evolução do homem foi coisa lenta e progressiva. Com muitos saltos. E surge o primeiro homo sapiens. A génese do homem moderno tem cerca de dez mil anos. E eu não acredito que alguém possa ser moderno ao fim destes anos todos. E as montras que se renovam a cada estação do ano? E os desfiles de corpos exercitados para aliciar mentes susceptíveis e carteiras em pele natural? Colecções para o frio. Para o calor e para a praia. Para o Inverno e para a noite. Padrões e feitios que se gladiam ciclicamente.
Os primeiros homens seriam ainda mais feios. Eu vejo-os muito feios. Grotescos e rudes. Uma mescla de homem e macaco. Muito peludos. Mas ágeis. Valha isso! Os macacos são uma espécie simpática. Continuam macacos. E divertem-se. Catam-se, coçam-se e brincam muito. Às vezes aborrecem-se e lutam uns com os outros. E gritam tanto! Afinal, sempre são os nossos ancestrais antepassados. Compreende-se a algazarra.
Outro animal que habita a terra é o lobo. É um bicho ruim. Muito associado à crueldade, rapacidade e ambição. O Capuchinho Vermelho, que o diga. Ou não é verdade que o lobo é mau e quer comer a incauta criancinha? Os pastores viram-se obrigados a criar cães pastores. Tudo por causa dos lobos. E a tia Rosa que me ameaçava com o temível bicho sempre que eu não comia a sopa? Mas Roma não. A maternal loba cuidou dos gémeos como se fossem seus filhos. Uma excepção aos hábitos do canídeo.
O macaco, o Homem e o lobo. O macaco fez-se homem. O homem age como se fosse lobo para aniquilar o macaco. E o lobo é que fica com a fama. Quem o diz é Hobbes que fundamenta a ferocidade entre os humanos homens. — o homem é o lobo do próprio homem. E o macaco é só macaco. Quietinho no seu galho.
E a notícia continua. Refere causas e consequências. E espanta-se. E o Homem perde a sua remota origem. Porque tem a mania que é lobo.
"O problema é que estes animais são facilmente atacados porque vivem em grupo e são barulhentos. Vai demorar a reverter esta situação porque são animais com relativa longevidade. É deprimente", explica Russell Mittermeier ilustre primatólogo.
E os homens não, senhor Mittermeir? Fazem tudo o que os macacos fazem. Mas com mais macacadas. Foram-se os dinossauros. Um dia destes os primatas. Tenho para mim que o Homem entra a seguir na linha da auto-extinção. Uma lobice, talvez, evitável. E como isto é cíclico, e acontece muito devagarinho, tenho pena de não estar cá para ver.
foto da Internet