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Abr09
coleccionar
Paola
colecções de tempos sem selo
Lembro-me, particularmente, dos postais ilustrados… Chegavam daqui e dali, atulhados de afeições. Havia colorido, movimento de espaços e de tempos… que me abordavam em pedaços. Eu guardava-os numa caixinha para, sempre que tivesse sede, os acariciar… Subia montanhas. Percorria castelos e sentia o perfume das flores. Saltitava de mar em mar… e adormecia no areal. E as borboletas! Tantas que borboleteavam na caixinha de cartão... Era assim que eu percorria o tempo, nas noites frias de Inverno. No silêncio que assustava os dias… nas minhas confabulações.
Na verdade, não coleccionei nada.... Abrigo, ainda, aquele postal que me enviaste no dia dos meus anos… Duas rosas descoradas. Murchas. Desfazem-se se lhes tocar… partir-se-ão em bocados, vítimas de corrosão. Ignoraste que eu não gostava de rosas... É um postal inútil… Não tem nada… escassamente tempo. O cheiro almiscarado do teu corpo há muito que abalara. Nem o reconheceria… mas pressinto o teu rosto pálido… aturdido… clandestino… Duas frases, quase ilegíveis, numa caligrafia apressada, deixam adivinhar incautas promessas... Entristeci de repente e rasguei-o. Acabou-se a colecção… A saudade é inútil e corrompe as mãos...
Na verdade, ninguém se magoa por coleccionar postais… mas fere a inexistência de escritores…
[imagem da internet]