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[Passeios ao domingo]
Aos domingos, dava passeios pela avenida principal. Alindava-se para os ver passar, invejando-lhes a agilidade. Até a ganância do primeiro beijo. Beijo doce. Salgado. Perfumado com odores de laranja. A turbulência das mãos na brandura do olhar. Mãos de seda que buscavam o Sol, nas vísceras do tempo. Na impermanência do querer.
Do lado de cima, tudo lhe parecia muito do mesmo. Na monotonia dos gestos. Na incontinência dos compromissos. Nos zunidos distantes da música. Do lado das raízes, nada se rebanhava na semelhança repetida aos domingos à tarde, na calçada. Tão diferente do lado de lá!
Já conhecia os seus passeios. Em tempos, contara-lhes as pedras, distinguindo as brancas das pretas. Mas havia as cinzentas. Turvas. Turbulentas e indecentemente indecisas. Embriagadas. Dessas, nunca entendera a cor.