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Jun09
cantar [o sabor das asas no telhado]
Paola
fotografia de Gabriel Gonzalez
Em cima do telhado, restolhavam trinados amarelos. A manhã trauteava réstias de Sol, com uns brincos de oiro pendurados nas orelhas. Os rubis refulgiam vermelhos incendiados. E ele esvoaçava de uma telha para a outra. Pulando como quem expulsa medos. Para, abundantemente, conservar a paixão. E cantava. O pássaro desafiava regozijos alegres. De uma telha para a outra. Sem ousar saltar para o outro lado da estrada. E olhava. De seguida, cantava. Ornatos musicais. Andamentos em sol maior.
Por baixo do telhado, um som. Música tónica e robusta. Martelo ritmado no aconchego das tábuas. Uma serra serrava. Ia e vinha, num vaivém semeado. E voltava ao princípio. Corrigindo imperfeições. Ouvia-se o gesto que martelava descontentamentos. Queixumes de satisafeitas canseiras. Da boca escorriam suores admirados. E as mãos amaciavam obras liquefeitas. Pressentia-se o ardor dos dedos que lavravam a madeira, na recusa da cola. Bebia-se o consolo de evitar os pregos. O carpinteiro sabia. E não queria rachaduras que fragilizassem a construção. Persistia. Na roda da água. Que bebia por baixo do telhado. No silêncio que brilhava quando o carrossel girava. E o pássaro gorjeava que o homem parara. Simplesmente contemplava.
Do outro lado da rua, um pássaro voava... Edificou um ninho no beiral inclinado da confiança e adormeceu a ler o poema. Então, cantou.