Abraça-me [como na fotografia]
Dá-me um abraço! Deixa-me tatear nos teus beijos. Agarra-me as mãos e escreve com elas um poema que toque nas estrelas. Dá-me um abraço para que os teus dedos sejam asas e eu voe com eles. E, quando chegada ao mar, possa atirar-te às minhas noites. Dá-me um abraço. E avisa-me quando chegares. Antes que partas, dá-me um abraço. Depois, só depois, é que te deixo tomar um café. Sem açúcar para que procures o meu corpo. E te adoces nele. Dá-me um abraço. Entra nos meus braços. Embriaga-te com o perfume que um dia escolheste para mim. Dá-me um abraço como se eu fosse a primavera onde buscas as andorinhas. Onde colhes as papoilas. Rasga-te nelas. Adormeçamos na decomposição da cor. Dá-me um abraço. Espreita o meu lado inacabado. Corrige-o como se estivéssemos na escola. Ri, mas dá-me um abraço. Agora podes olhar em teu redor. Podes, se fores capaz de perceber a felicidade que brota de mim. Dá-me um abraço! Se ficares feliz assim. Dá-me um abraço. Um copo de sangria sabe sempre bem. Dá-me um abraço antes que eu acorde e deixe cair o copo. Ou os braços. Abraça-me e lambe as feridas expostas pela melodia do dia. Enxota os pardais e deixa-me ouvir a canção que passa na rádio. Abraça-me. Decifra-me como se eu fosse uma folha em branco. Escreve-me para que me possas ler. Depois conta-me uma história. Sem alterar as palavras. Ou os planos. E estende-me uma narrativa aberta. Sabes que não aprecio fins determinados. Deixa-me ouvir sem pressas. Com repetições. Descobre frases para repetir. Há parágrafos que devíamos trilhar como se o caminho fosse esse. Abraça-me para que sejamos mais do que a história. Mas cala-te! Não canses as palavras. Liberta-as da voz egoísta do narrador. Gasta as tuas. Abraça-me mais uma vez. Depois mostra-me a fotografia. Para que eu recorde o princípio. Quando nos abraçámos com os olhos. Abraça-me! Para que eu celebre o momento.