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ponto de admiração

ponto de admiração

26
Mai08

pelos poetas - definições arrojadas

Paola

 

ler Afinal de contas, ler faz muito mal às pessoas: acorda-as para realidades impossíveis, tornando-as incapazes de suportar o mundo insosso e ordinário em que vivem.

 

 

Pedi, hoje, aos meus alunos que falassem de poetas. Isso mesmo, “O poeta é...”. A intenção era começar pelo autor para chegar ao poema e à poesia. A tarefa não foi, de início, bem aceite. É que os meus alunos aborrecem-se com a escrita. E enfastiam-se a pensar. É tudo uma canseira. Nada melhor, dizem eles, do que o professor ditar apontamentos. Fantástico mesmo é uma ficha com tudo escrito. Assim como uma lata de salsichas para cachorros-quentes. Com abertura fácil. Tem sempre a enorme vantagem de dispensar o abre-latas, instrumento obsoleto que só complica o processo. Basta abrir. Pensar é que não. Não é que a culpa seja deles. Até penso que não! Mas como a culpa não morre solteira, alguém tem que assumir este pântano de facilidades, de aberturas fáceis em que os nossos jovens se enlatam diariamente. Essa coisa de estar sempre a culpar o sistema já irrita. Particularmente, porque não estou a falar de futebol. Desculpem, mas não consigo ver nas pernas e nos pés dos meus alunos dribles espantosos e muito menos uma jogada estudada. Também nenhum deles se chama Ronaldo ou Luís. Podem sempre mudar, lá isso podem.Todos acreditam nas suas potencialidades. Todos se vêem ases da bola. Todos fantasiam um futuro jogado num relvado verde, com muita assistência e com contratos de milhões. Porque é essa a realidade com que se deparam todos os dias. Na televisão, nos jornais, nas revistas... os craques da bola são sempre a primeira página. Para eles a luz da ribalta. São as vidas caras, as caras da vida deste país que nutrem os sonhos dos mais jovens numa verdadeira euforia à inglesa. Mas muitos ainda não olharam para os seus pés. De barro, em muitos casos.

 

 

Nada contra, até gosto de futebol. O problema está na perda da consciência da vil realidade. E é neste mundo de facilidades que a maioria dos nossos jovens vive. Assim, alienados. Tal como o país. Acreditou que era europeu. Bastou-lhe assinar um tratado para se sentir espanhol, sueco ou finlandês. Puro engano. Por muito que isso nos custe, Portugal apenas é, cada vez mais, europeu por casualidade geográfica e a sua alma erra por aí, apostada na imitação de modelos desconformes e incompatíveis com vontades batalhadas há séculos. É este querer reproduzir os outros que me aborrece. Talvez seja por isso que detesto imitações e que elejo o slogan que repete, sem que seja ouvido por quem de direito, que o nacional é bom. Deixem a Finlândia para os finlandeses. E já agora, a bola para o Ronaldo.

 

 

E a poesia é dos poetas que não são passíveis de cópia. E não ter noção que o plágio é um crime que lesa os direitos de autor é coisa feia. Não concordo com a teoria do elogio. Que se copia para engrandecer o copiado. Tretas! Ideias roubadas, são ideias roubadas ponto final. Venham donde vieram. Do Chile ou da Finlândia. De França menos mal. Gosto tanto de acreditar que os bebés chegam no bico das cegonhas... Apesar de nunca ter percebido se falavam a língua de Panoramix. Bolas! Não me tirem isto também!

 

 

E lá foram saindo algumas definições por bocas sem hábitos poéticos. O poeta é um romântico. Um sonhador. Um inventor de palavras. Um fingidor. Um trapaceiro da gramática. Um mentiroso. É quem escreve poesia. Todos explicavam as suas crenças numa língua feita de enormes imperfeições. E continuaram. Um poeta é um sentimentalista. Um criativo. Um poeta é aquele que nos faz chorar. E rir, acrescentou alguém. Eu fui dizendo que sim. Aprimorando as frases, desfazendo equívocos.

 

 

Um dedo levantou-se de repentinamente. Como que animado por uma qualquer ideia brilhante, ergueu-se expedito e determinado a ser atendido. Mal o vi, disse-lhe que sim.

 

 

- Um poeta é um mágico! – Afirmou convincentemente.

 

- Porquê? – Perguntei.

 

- Ora, porque esconde, mostra e baralha as palavras. - Explicou.

 

 

E, nesta aula, ficou acordado, por unanimidade, que um poeta é um ilusionista de palavras.

 

 

Porque

 

“Ser poeta não é uma ambição minha. /É a minha maneira de estar sozinho.”

 

                                                                                                                              (Alberto Caeiro)

 


 (imagem de luradoslivros.files.wordpress.com/)

19
Abr08

da gramática - normas explicadas

Paola

 

    A dúvida instalou-se. As certezas refugiaram-se na página não sei quantos do caderno de actividades. Estes cadernitos são aqueles livrinhos que se amarram aos manuais escolares, quais carraças desumanas que teimam em não largar o dito… Há livrinhos assim! Outros há que nem se enxerga a paragem… A notícia dá-os como parte integrante, como oferta ao aluno… Coitado do aluno! Na livraria dizem-lhe que tem que pagar mais uns euritos… e ele não paga, claro. Eu também não pagava, pronto! Desde quando é que se pagam ofertas? Mas há quem não saiba… Tentar não custa!

 

Além do mais, é pequenote, frágil, magrito… Não dá jeito nenhum colocá-lo na mochila. Não é que pese assim tanto, mas, convenhamos, não se descobre facilmente no meio do desarrumo livresco dos nossos meninos. Por isso, fica esquecido vezes sem conta. Em casa, é óbvio! E as nossas crianças têm tantos Cadernos de Actividades! É natural que os confundam, que os associem aos manuais errados… as capas são tão idênticas. Uma distracção qualquer um tem. Eu tenho, confesso.

 

A dúvida! Eu estava a falar dela, não estava? Surgiu a propósito de uma forma verbal. É que os textos têm estas palavras difíceis e a gente tem que as entender e ainda por cima explicar. Como se não tivéssemos uma gramática dentro de nós desde que viemos ao mundo… Chegamos à escola e é tudo tão minucioso, tão complicado…Foi assim que veio à baila a conjugação pronominal. De explicação em explicação; de exercício em exercício lá se foi fazendo luz. Terminada a saga do pronome, do verbo e do Caderno de Actividades, que uns têm e outros não, respirei de alívio. Aquilo cansa! Vamos ler, interpretar o texto, brincar com as palavras, descobrir polissemias e jogos que tais…Sentidos escondidos…É muito mais interessante, acrescentei.

 

Oh, Nãoooooooo! Exclamaram alguns, num tom que me permitiu pressentir que estavam a gostar, que queriam mais… Vá lá entender isto!

 

Gramática? Querem mais? Estavam a gostar? Juro, que não entendia tal desejo…

 

Ao fundo da sala, levantou-se um dedo. Indeciso, receoso, porém determinado. E disse “ É que explica tão bem…”. Houve mais uns tantos que concordaram. Encostei-me ao quadro… Depois, a aula continuou, com leitura, com partilha de interpretações…

 

Hoje, descubro naquelas palavras um aplauso. Foi isso que me quiseram dizer, apenas isso. Elogiar o meu trabalho, o meu empenho. Obrigada, meninos.

 

O que os meus alunos não sabem, não tenho que lhes dizer, é que não gosto nada de “gramática”. Nada, mesmo! As regras estorvam a minha liberdade de pensamento, de escrita… impõem-se aos meus sentimentos, importunam-nos, impedem-me de respirar… No entanto, não me impedem de bem explicar, de fazer o meu melhor…  Também não lhes disse que um professor é um fingidor, que chega a fingir que gosta daquilo que na verdade ama...


Posso explicar? Gosto muito da minha profissão.

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Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto. [Fernando Pessoa]

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