Não vou à rua [para não me estorvarem os passos]
À noitinha, gosto de andar. Passadas ansiosas, mornas. Devagar. Dissolvo as horas, percorro a avenida guarnecida com linhas azuis vindas do rio. Atalho o tempo. Desfaço o espaço numa amálgama de aromas. Apago as sombras e os riscos. Gasto passos. E peço-te que não tenhas pressa. Que tornes aos gritos de outrora. Para irmos à feira voar no carrossel. Quero agarrar-me à girafa que teima em erguer-se na incerteza das voltas. Sentar-me no colo do cisne de brancos e quietos cantos. Quero as minhas nas tuas mãos reclamando palavras de algodão-doce. E prosseguimos num passo impaciente até à fonte que sustenta as verdes e bravas piteiras de figos açucarados. Eu gosto de andar. Correr pelo chão resguardado pelos versos dos poetas. Hoje não vou à rua. Não gosto que me obriguem a parar.