Penso em ti. Sem me inquietar como o meu corpo. É ele que se afasta de mim. Ficaram as nódoas de uma dor dividida. Até ao momento em que o Sol não dure até ao final do dia. E os pássaros tenham esquecido a letra da canção. A mesma que nos entendia de cor e trauteávamos junto ao rio… Como se abril fosse um porto de abrigo. No concreto de um abraço. Na agitação do beijo. Agora, eu anoiteço na suavidade das minhas memórias. Entre as estrelas e o céu. As papoilas e o vento, há raízes que se agarram ao chão.
Nos dias em que nada faço, vejo aquilo que os outros criam. Então, no silêncio da minha letargia, ponho-me a olhar… E uma grande incerteza enfraquece o meu pensar… Não sei se eles sabem o que estão a fazer… ou se é tosca a janela por onde estou a espreitar!
O que é pensar. Como fazê-lo? E procurei razões que suportassem o acto. Avaliei os custos, já que, nos tempos que correm, é questão determinante. Pagam-me para pensar? Eu sei a resposta, mas enfim… Interroguei-me sobre a indispensabilidade do gesto. É mesmo preciso atormentar o cérebro com reflexões sofisticadas? Tentei perceber os tempos e os espaços. Quando? Devo pensar todos os dias? Há dias consagrados à razão? Não creio ser essencial pensar em todo o lado. Nem correcto. Só traria aborrecimentos. As pessoas a conversar disto e daquilo e eu a pensar. Não resultaria. Posteriormente, encetei outro tipo de raciocínio. E a dúvida instalou-se. Pensar sozinha não me levará a lado nenhum. É muito aborrecido. Mas pensar não é, como nascer e morrer, um acto individual? Não, não estou a pensar bem. Até são dois momentos da vida muito partilhados. Um para rir outro para chorar. No colectivo. Pensar acompanhada envolve alguma promiscuidade. Usurpa intimidade. Nem tudo o que passa pela cabeça é dizível. Antes uno e intransmissível. Penso eu! E como actuar? Em voz alta? No mais clandestino silêncio? Digo ou não digo o que estou a pensar? E o que estou a pensar será mesmo pensar? E acredito que o que estou a pensar não interesse a ninguém.
Pensar humano é. É? Então, pensamos todos. Sim! E ele, como é que pensa? Olha para o poema. E depois? Finge-se escritor ou contenta-se em ser autor? Talvez não e apenas seja um pensador… que pensou em voz alta. Ou o outro. Fernando Pessoa cogitou. Tanto que se multiplicou. Facto que em nada me ajudou. Continuo sem saber o que é pensar. Vou experimentar pensar por conta própria. Talvez resulte. Não dá! Preciso de alguém. De alguma coisa. Dos pensamentos dos outros. E não é honesto. É? Só que não tenho alternativa.
Pensar é conhecer. Julgar e raciocinar. E também comparar, compreender e saber. E não é evoluir, engendrar, sentir, criar, construir e destruir? Se assim for, exige esforço. Tanto trabalho é excessivo. Nem sei se sou capaz. Às vezes não sou. Mas não desisto de pensar que um aluno, que tenha as soluções preparadas e definitivas, não será capaz de resolver problemas do dia-a-dia. Nem tomar decisões importantes. Tão pouco pensar. Sozinho ou acompanhado. Mas pensar cansa, por isso não gosta. Não está treinado para pular e saltar. Sem parar. Não está disposto a dar uma oportunidade à solução.
Talvez seja por tudo isto, ou exactamente por nada disto, que o Simão estendeu os olhos pela sala. Depois olhou para mim.
- Professora, desista… Não é melhor dar já a resposta?
Já estava cansado. E eu também. Porque pensar dá trabalho. Então, eu dei!
Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto.
[Fernando Pessoa]