23
Nov08
pavonear
Paola
da Internet
vaidades espelhadas
Da estrada vê-se a casa. Pavoneia-se vaidosamente no dorso da duna. Mostra-se de lado e de frente. Acorda de manhã, pinta-se de branco e põe-se à janela. Corpo perfeito com decididas linhas azuis. Sempre a rumorejar promessas de amor. Pela areia ensolarada, descem passos satisfeitos e sobem cansaços suados. Pela ladeira, em movimentos ritmados pelo Sol.
A casa insiste na sua verdade. Autenticidade, acrescenta, se muito a indispõem. Diz-se assim. Que nem gosta de presunções. Que a beleza é natural. Nega-se na policromia colorida, que é coisa do pretensioso pavão. Ela não. É sua condição.
A casa contempla o rio que se ajoelha a seus pés. Está apaixonado, coitado! Escreve-lhe poemas de espuma. Marulha-lhe sonatas ao luar. E arremessa-lhe brisas perfumadas com agitações de marés. Ao anoitecer, a agonia do manso rio ainda é mais triste… Espelha-se no seu amargurado estar. Nas decepcionadas ondas que vêm chorar na praia. Com sabor a sal. E todos os dias ele corre para o mar no desejo de a fazer mudar.São os pinheiros que escondem o ritmo arrebatado daquele gostar. Indefinida eternidade!
A casa permanece na duna. O rio é que anda para cá e para lá, sempre ali. São assim. Se não fossem não seriam rio e casa… antes uma rã enlouquecida que almejou ser boi. Tanto o invejou que não retardou a insuflar-se de ares bovinos. Queria ser grande, a tresloucada! E inchou na vaidade da transfiguração. E os outros anuros pediam mais e muito mais. E ela inchou, inchou, inchou! Até que estoirou. Foi a pele que não suportou tão grande vaidade.
Essa tola ambição da rã que quer ser forte
Muitos homens conduz ao desespero e à morte.
Muitos homens conduz ao desespero e à morte.
A casa continua na sua verdade E o rio faz-lhe a vontade. O pavão é que pavoneia imodéstia. Perdeu a serenidade.